Data de 1921 a primeira referência ao Café Santa Cruz pelos jornais da época – “O Despertar”, “A Gazeta de Coimbra” e o “Correio de Coimbra” – como “O Café Manuelino”, uma associação ao estilo arquitetónico do edifício.
Foi no reinado de D. Manuel I (1495-1521) que se desenvolveu a política expansionista, iniciada por D. João II (1481-1495).
A abertura da rota oceânica, encetada por Bartolomeu Dias e prosseguida por Vasco da Gama, em finais do século XV, proporcionou o recomeçar da expansão portuguesa. As diversas conquistas de importantes cidades na Índia, possibilitaram um incremento comercial, entre os espaços económicos do Ocidente e do Oriente.
Com as sucessivas viagens ao oriente, Portugal manteve o monopólio do comércio de especiarias (pimenta, gengibre, canela e cravo) até cerca de 1570. Porém, a maior riqueza advinha dos impostos e, principalmente, do ouro da Mina proveniente da Guiné.
Em 1500, Pedro Álvares de Cabral descobre o Brasil, alargando os territórios descobertos por Portugal no início do século XVI. A expansão territorial de Portugal, bem como o seu poderio económico, chegava agora a 4 continentes.
O reflexo deste novo mundo, que ia sendo descoberto, da conquista de novos territórios, das novidades que iam surgindo fruto das viagens dos descobrimentos, com a chegada de muitas riquezas (ouro, joias, porcelanas, tecidos, especiarias) permitiu que Portugal vivesse um período único e que conquistasse peso político, económico e social na Europa.
Fruto desta euforia, das novidades, da intensificação do comércio externo, da riqueza que, entretanto, chegava ao Reino, o Rei D. Manuel I promoveu a maior campanha de construção de edifícios desde a criação do Reino de Portugal. Estas intervenções foram tão intensas que o seu nome ficou associado a um estilo arquitectónico: o manuelino.
Nesta época, Lisboa era considerada uma cidade cosmopolita, frequentada por pessoas originárias dos continentes entretanto descobertos. Naturalmente que era atractiva, principalmente pelo poder económico de Portugal, para muitos reputados artistas estrangeiros (das mais diversas áreas) que desejavam colaborar nestas reformas encetadas pelo Rei D. Manuel I.
A sua intervenção foi essencialmente na construção de igrejas, mosteiros, palácios e hospitais. Foram feitas grandes requalificações em espaços religiosos já existentes como são exemplo o Convento de Cristo de Tomar, o Mosteiro da Batalha, o Convento de Jesus (Setúbal), o Convento dos Lóios (Évora), o Convento da Nª Sª da Conceição (Beja), a Sé de Lamego, a Sé do Funchal, o Palácio de Sintra e o Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra. Em todos estes espaços ficou fortemente vincado o estilo manuelino.
No seu reinado as obras de referência são o Mosteiro dos Jerónimos (1501) e a Torre de Belém (1515), onde, entre outros, se podem encontrar os símbolos do Rei D. Manuel I: a Esfera Armilar e a Cruz de Cristo.
É no reinado de D. Manuel I que se desencadeia a revitalização dos diversos espaços do Mosteiro de Santa Cruz, que se encontravam em avançado estado de degradação. Para além do melhoramento das instalações, inclusivamente aumentadas, esta intervenção também previa a construção de uma condigna sepultura para os 2 primeiros Reis de Portugal, D. Afonso Henriques (1179-1185) e D. Sancho I (1185-1211). Aqui revelou uma grande preocupação na amplificação / engrandecimento / promoção da memória histórica nacional ao mandar erguer novos túmulos no local onde existiam uns pouco dignos para os primeiros Reis de Portugal. Após a morte do Rei D. Manuel I, o Rei D. João III (1521-1537) prossegue as obras previstas, por seu Pai, para o Mosteiro de Santa Cruz.
No âmbito desta profunda intervenção foi mandada construir, no ano de 1530, a Igreja de S. João de Santa Cruz, também designada por Igreja de S. João das Donas, local onde está instalado o Café Santa Cruz (inaugurado a 8 de Maio de 1923).
Estilo Manuelino?
Pretende transmitir, através da arte, a grandeza da nossa história. Exaltar, evidenciar, os feitos protagonizados pelos portugueses nos finais do século XV, princípios do século XVI: as descobertas, as conquistas e as riquezas que chegavam a Portugal, oriundas de 4 continentes. Fruto deste poderio económico, militar e político, o estilo manuelino propagou-se por todas os nossos domínios ultramarinos.
O estilo manuelino era caracterizado pela exuberância das formas, através de motivos associados ao naturalismo vegetalista flamejante a que se juntavam novos elementos do dia a dia das populações (cadeias, cordas, cestos de vime, fivelas, …).
Os elementos decorativos naturalistas (troncos, ramos, folhas, conchas, raízes) conjugavam com outros elementos de inspiração marítima (redes, esferas, cordas, conchas, algas, …).
A Esfera Armilar, símbolo do poder régio, e a Cruz de Cristo, símbolo do poder divino, são os motivos / símbolos mais importantes da arte manuelina.
Estilo Neomanuelino
No século XIX a influência do estilo manuelino tornou-se evidente na construção e na reabilitação dos edifícios. O simbolismo em torno do império português, o revivalismo, a nostalgia do passado – relembrar os gloriosos feitos conseguidos ao longo do século XVI – traduziu-se no aparecimento do neomanuelino. Este novo estilo tornou-se um valor, uma condição cultural, nesta fase da história de Portugal.
Os grandes exemplos do neomanuelino são o Palácio do Bussaco, o Palácio da Pena e o Palácio da Regaleira, ambos em Sintra.
Concluindo, faria sentido a criação de uma Rota Manuelina, onde percorrêssemos e visitássemos por Portugal, os diversos edifícios construídos e / ou intervencionados pelo Rei D. Manuel I, que provocou a criação do estilo manuelino e, mais tarde, influenciou o estilo neomanuelino.
Coimbra, 31 de Dezembro de 2022.
Bibliografia
Braga, Paulo Drumond, D. Manuel I (1469-1521), CTT, 2021
RTP: “Imagens da Arte Portuguesa – Manuelino, um Estilo”, 1985
https://ensina.rtp.pt/artigo/manuelino/
RTP, Visita Guiada: “Palace-Hotel do Buçaco”, Ep. 3 – 25 Maio de 2015
https://www.rtp.pt/play/p1867/e196245/visita-guiada